sexta-feira, 17 de maio de 2013

O Troll de Havayaga - Segunda parte


                                                                                                   (Arte de Jaime Nunes)


Lembro-me de seis anos atrás, quando encontraram a criança próxima ao rio da sereia. Era um bebê forte, um garoto. Pousado ao lado dele encontrava-se um grande corvo. O pescador que o encontrou teve receio de se aproximar, temendo que a enorme ave o atacasse, mas depois de um tempo ele conseguiu pegar o menino e lava-lo para a aldeia.

Foi um grande alvoroço naquele dia. As pessoas, curiosas sobre o estranho bebê, se reuniram na grande tenda de nosso senhor. Era como um garoto normal, não fossem as orelhas pontudas e o enorme corvo que não saia de seu lado, detalhes que intrigavam ainda mais meu povo. Daaga, o oráculo de nossa tribo, depois de muito examinar, disse não saber a origem da criança, mas que os homens que viviam na Floresta Wëa, além do rio, poderiam saber.

Os que viviam além do rio eram chamados de “Os Filhos de Fähara” e diziam-se donos de todo lugar ao sul do mundo, inclusive das terras de minha tribo, mas não exigiam nada de nós. Meu pai contava que eles estavam ali muito antes de nossos primeiros ancestrais, vindos do norte, atravessarem o grande deserto de gelo e fizerem morada nas terras do sul.

Como os Filhos de Fähara eram vistos raramente e preferiam não se misturar com os nossos, foram enviados emissários de minha tribo até a Floresta Wëa, pedindo ajuda.

Os homens da floresta chegaram com a noite em nossa aldeia, dois dias após o retorno de nossos emissários. Eram três. Eles tinham o dobro do tamanho de qualquer um de minha tribo, até mesmo do maior de nós. Os cabelos eram negros, de aspecto sujo, sem nenhum brilho. Trajavam grossas peles de animais, que pareciam ser de lobo ou urso. Um odor forte os acompanhava. Havia símbolos estranhos desenhados em seus rostos com uma tinta azulada. Não possuíam nenhum tipo de arma aparente.

Daaga estava com a criança no colo, próximo a uma fogueira. O recém-nascido chorava muito. O menor dos homens da floresta foi ao encontro deles. Tinha o olhar penetrante e aparentava ser um feiticeiro pelos trajes e amuletos que usava. Não se via um sorriso ou gesto de cordialidade vindo dele. Parecia um lobo soberano, caminhando entre ovelhas.

O feiticeiro pegou o bebê nos braços, que logo parou de chorar. Levantou um dos braços para o enorme corvo pousar. Olhou fixamente nos olhos da ave, os dois pareciam se comunicar. Depois de um tempo o corvo esticou a cabeça e bicou o centro da testa da criança. Não se ouviu nenhum choro. As pessoas pareciam assustadas, mas estavam imóveis, curiosas sobre o que acontecia. O homem devolveu a criança ao Oráculo e logo depois passou a unha pelo peito do corvo, fazendo um pequeno corte, com o sangue que escorria ele fez desenhos pelo corpo do bebê, começando pela testa e indo até os pés. Era um ritual. O primeiro que presenciei em minha vida.

Terminado o rito o Feiticeiro de Wëa se aproximou do Oráculo e entregou o bebê, os dois conversaram por um tempo. Daaga disse em voz alta que aquele bebê era um Heddan, uma raça antiga, que havia sido extinta de nosso mundo após uma grande guerra. O corvo era um Garú Wëa, que na nossa língua significava algo como “animal antigo”, e tinha uma ligação espiritual com o bebê. Disse também que a criança era uma dádiva para nossa tribo, que deveríamos cuidar dela como se fosse filha de todos nós e, na idade certa, um arauto dos velhos espíritos viria busca-la e leva-la até seu devido lugar.

Aquela foi uma noite de festejos na aldeia. Os homens da floresta partiram sem dizer adeus.

Com o tempo nós percebemos que o Feiticeiro de Wëa estava certo no que disse. Nossas colheitas eram mais prósperas a cada ano que se passava. Membros de outras tribos vinham de todas as partes para ver o menino. Amavam e respeitavam a criança e isso evitou muitas guerras. O garoto crescia forte, era tão amável que conseguia cativar até mesmo os de coração mais frio. Fazíamos como nos recomendaram e criávamos o menino como se fosse filho de todos nós, deixando-o comer, dormir e brincar onde quisesse.

Tudo caminhava bem, até o dia do desaparecimento.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

O Troll de Havayaga - Primeira parte



Relato de Liam "Chifre de Alce", ex-bardo:

Lembro-me vagamente daqueles dias...

Eu era um jovem de aproximadamente dezessete anos. Tinha longos cabelos castanhos e não havia sinal da longa barba que disfarça os traços de minha idade atual. Apesar da pouca idade, eu era um exímio caçador. Forte, ágil, muito hábil com arco e flecha. Habilidades que os anos de bebedeira e exageros me tiraram.

Era uma noite de outono e eu retornava para minha aldeia após um cansativo dia de caça. A lua brilhava como uma enorme lamparina no céu, facilitando minha visão naqueles caminhos escuros. Embora meu pai sempre me alertasse para não caçar fora dos arredores de nossa aldeia muito tarde da noite, não houve como obedecê-lo. Perdi quase metade da tarde procurando as armadilhas que espalhei pelo bosque. Mas valeu a pena, pois nas armadilhas encontrei três coelhos gordos e um pequeno javali, que serviriam de alimento por, pelo menos, uma semana.

Sai da floresta em que caçava e passei a caminhar pela estrada chifre de alce, estrada principal que ligava todas as aldeias daquela região. Após um tempo de caminhada me aproximei do bosque de Havayaga. As lendas sobre aquele lugar falavam de uma bruxa centenária que havia sido aprisionada no corpo de uma garotinha e sempre andava acompanhada de um alce e um enorme javali negro. Mesmo com idade para não acreditar mais naquelas histórias, eu sempre me arrepiava ao passar por aquele estranho lugar.

Apressei-me ainda mais naquele trecho do caminho e foi quando um grunhido aterrador tomou conta de meus ouvidos. Senti meu corpo inteiro arrepiar. Quando me dei conta, estava parado na estrada, como se minhas pernas estivessem se fundido ao chão de terra batida. Ouvi novamente o grunhido e tive certeza de que vinha do sinistro bosque. Um choro de criança parecia ecoar pelo caminho. A única reação que tive foi a de deixar tudo o que poderia atrapalhar minha agilidade, até mesmo as presas de minha caçada, e sair em disparada até a aldeia.

O choro da criança me acompanhou até a entrada da aldeia. Parei, com o coração quase saindo pela boca e caminhei rapidamente em direção a minha casa. Percebi o primeiro sinal de que havia algo de errado. Algumas pessoas estavam do lado de fora de suas tendas, algo muito incomum, pois era tarde da noite e as pessoas dali dormiam cedo. Vi meu pai de pé em frente à uma fogueira, conversando com algumas pessoas. Aproximei-me deles e perguntei o que estava acontecendo. Meu pai disse que uma criança de nossa tribo havia sido levada da aldeia.

Todos aqueles acontecimentos estranhos pareciam estar relacionados. Contei a eles sobre os sons que eu tinha escutado, vindos do bosque de Havayaga, mas meu relato só deixou todos mais aflitos.

Cada pessoa tinha uma teoria sobre o desaparecimento da criança e todas as especulações acabaram quando apareceram dois caçadores contando que encontraram pegadas enormes próximas ao lugar onde a criança havia desaparecido. Ao que tudo indicava, iam em direção ao bosque de Havayaga.

A criança desaparecida era especial para todos da tribo. Ela tinha um dom...

domingo, 7 de abril de 2013

A Profecia de Havayaga, a Bruxa Criança

"A criança escolhida,
Na boca do Troll está.
E se a vida lhe der uma chance,
Levará a morte, onde quer que vá!"

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Rei das Batalhas

Tudo estava acabado.
Aquele que sonhava morrer como um rei padeceu sobre um trono digno de seu reinado, sentado em uma pilha de corpos, lanças, escudos e espadas.
O Sangue de seus inimigos era o pagamento aos velhos deuses para sua entrada nos reinos eternos.
Não havia lágrimas nos olhos de seus companheiros, apenas um sorriso de orgulho por terem lutado ao lado daquele grande guerreiro.
A chuva caía. As trombetas proclamavam o fim. O Rei das Batalhas estava morto.